quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

Miss Mofo

Certo dia sentou-se ao pé de mim. Atrevera-se antes a sentar a dois lugares, uma fila de diferença, mas mesmo ao lado, nunca. Cinquentona com ar de quem quer parecer moderna, cabelo à Helena Isabel, mas não indo além do tipo esfregão de loiça. Madeixas manhosas, de todos os tons de loiro possível, arriscando ainda algumas em tons alaranjados. Corpo que já só uma plástica salvaria, apesar de não se poder considerar mau para a idade. Competindo com dezenas de jovenzinhas no pico da idade, com as hormonas a rebentar pelos poros, usa óculos que insinuam a perversidade da secretariazinha madura. Talvez a ver se chama a atenção de algum dôtor.
No entanto, apesar das aparentes tentativas para se manter fashion, a senhora insiste numa particular peça de roupa, que insiste em usar, pelo menos, sempre que a vejo (e falo de mais de uma vez por semana, o que, para gaja, é escandaloso). Nada mais, nada menos que umas calças de cabedal pretas. Está bem que o cabedal preto dá com tudo, oferece uma aparência arrojada, mas com limites. Ela lá muda de camisolas, casacos, camisas, etc., mas as calças de cabedal pretas estão sempre presentes. Dão-lhe ar de quem já não está bem a ver o que o espelho lhe diz.
Tentou ser simpática, o que eu permiti. Erro meu. Ao fim de alguns minutos já estava a olhar por cima do meu ombro para copiar o que eu escrevia, o que odeio, e logo deu um largo passo: atreveu-se a desviar a minha mão de cima da folha para poder ler melhor. Enfureci, mas dado o contexto, não me pude dar ao luxo de a repreender (no mínimo).
Apesar de estranha, a senhora é simpática até dizer chega, o que me parece ter por trás o facto de precisar de contactos para pedir cenas, tipo apontamentos e assim. Porém, ali, ao meu lado, estava a deixar-me enjoada. Já tinha notado antes, à distância, mas, ali ao lado, a coisa era exponencialmente pior. A senhora tresanda a mofo! Sim, mofo, aquele cheiro a roupa que não sai do armário há anos e que desaparece se a puseres umas horinhas ao ar, ou lavando-a! Não sei se Miss Mofo conhece a técnica, mas parece que é bastante eficaz. Desconfio que não. Aquilo mete mesmo fastio, tira a fome a qualquer um. Não deve ter amigas. Se fosse uma das minhas, eu já lhe tinha dito. Assim, que se lixe. Limito-me a ver onde ela se senta, para manter pelo menos dois metros de distância de segurança. Para o meu bem.

3 comentários:

Müs disse...

Mas quem era a relíquia?

Mestre Isplinter disse...

Mas isso é um paradoxo...
Usa sempre a mesma peça de roupa, mas cheira "a roupa que não sai do armário há anos e que desaparece se a puseres umas horinhas ao ar"?

A Côca disse...

A relíquia é a própria Miss Mofo, com quem me me deparo várias vezes por semana. Pergunto-me como consegue ter sempre aquele cheiro...se calhar já vem dela. Está podre, só pode.